terça-feira, 5 de maio de 2009

HISTÓRIA DOS NÚMEROS

A noção de número e suas extraordinárias generalizações estão intimamente ligadas à história da humanidade. E a própria vida está impregnada de matemática: grande parte das comparações que o homem formula, assim como gestos e atitudes cotidianas, aludem conscientemente ou não a juízos aritméticos e propriedades geométricas. Sem esquecer que a ciência, a indústria e o comércio nos colocam em permanente contato com o amplo mundo da matemática.

A LINGUAGEM DOS NÚMEROS
Em todas as épocas da evolução humana, mesmo nas mais atrasadas, encontra-se no homem o sentido do número. Esta faculdade lhe permite reconhecer que algo muda em uma pequena coleção (por exemplo, seus filhos, ou suas ovelhas) quando, sem seu conhecimento direto, um objeto tenha sido retirado ou acrescentado.

O sentido do número, em sua significação primitiva e no seu papel intuitivo, não se confunde com a capacidade de contar, que exige um fenômeno mental mais complicado. Se contar é um atributo exclusivamente humano, algumas espécies de animais parecem possuir um sentido rudimentar do número. Assim opinam, pelo menos, observadores competentes dos costumes dos animais. Muitos pássaros têm o sentido do número. Se um ninho contém quatro ovos, pode-se tirar um sem que nada ocorra, mas o pássaro provavelmente abandonará o ninho se faltarem dois ovos. De alguma forma inexplicável, ele pode distinguir dois de três.

O corvo assassinado
Um senhor feudal estava decidido a matar um corvo que tinha feito ninho na torre de seu castelo. Repetidas vezes tentou surpreender o pássaro, mas em vão: quando o homem se aproximava, o corvo voava de seu ninho, colocava-se vigilante no alto de uma árvore próxima, e só voltava à torre quando já vazia. Um dia, o senhor recorreu a um truque: dois homens entraram na torre, um ficou lá dentro e o outro saiu e se foi. O pássaro não se deixou enganar e, para voltar, esperou que o segundo homem tivesse saído. O estratagema foi repetido nos dias seguintes com dois, três e quatro homens, sempre sem êxito. Finalmente, cinco homens entraram na torre e depois saíram quatro, um atrás do outro, enquanto o quinto aprontava o trabuco à espera do corvo. Então o pássaro perdeu a conta e a vida.

As espécies zoológicas com sentido do número são muito poucas (nem mesmo incluem os monos e outros mamíferos). E a percepção de quantidade numérica nos animais é de tão limitado alcance que se pode desprezá-la. Contudo, também no homem isso é verdade. Na prática, quando o homem civilizado precisa distinguir um número ao qual não está habituado, usa conscientemente ou não - para ajudar seu sentido do número - artifícios tais como a comparação, o agrupamento ou a ação de contar. Essa última, especialmente, se tornou parte tão integrante de nossa estrutura mental que os testes sobre nossa percepção numérica direta resultaram decepcionantes. Essas provas concluem que o sentido visual direto do número possuído pelo homem civilizado raras vezes ultrapassa o número quatro, e que o sentido tátil é ainda mais limitado.

Limitações vêm de longe
Os estudos sobre os povos primitivos fornecem uma notável comprovação desses resultados. Os selvagens que não alcançaram ainda o grau de evolução suficiente para contar com os dedos estão quase completamente disprovidos de toda noção de número. Os habitantes da selva da África do Sul não possuem outras palavras numéricas além de um, dois e muitos, e ainda essas palavras estão desvinculadas que se pode duvidar que os indígenas lhes atribuam um sentido bem claro.

Realmente não há razões para crer que nossos remotos antepassados estivessem mais bem equipados, já que todas as linguagens européias apresentam traços destas antigas limitações: a palavra inglesa thrice, do mesmo modo que a palavra latina ter, possui dois sentidos: "três vezes" e "muito". Há evidente conexão entre as palavras latinas tres (três) e trans (mais além). O mesmo acontece no francês: trois (três) e très (muito).

Como nasceu o conceito de número? Da experiência? Ou, ao contrário, a experiência serviu simplesmente para tornar explícito o que já existia em estado latente na mente do homem primitivo? Eis aqui um tema apaixonante para discussão filosófica.

Julgando o desenvolvimento dos nossos ancestrais pelo estado mental das tribos selvagens atuais, é impossível deixar de concluir que sua iniciação matemática foi extremamente modesta. Um sentido rudimentar de número, de alcance não maior que o de certos pássaros, foi o núcleo do qual nasceu nossa concepção de número. Reduzido à percepção direta do número, o homem não teria avançado mais que o corvo assassinado pelo senhor feudal. Todavia, através de uma série de circunstâncias, o homem aprendeu a completar sua percepção limitada de número com um artifício que estava destinado a exercer influência extraordinária em sua vida futura. Esse artifício é a operação de contar, e é a ele que devemos o progresso da humanidade.

O número sem contagem
Apesar disso, ainda que pareça estranho, é possível chegar a uma idéia clara e lógica de número sem recorrer a contagem. Entrando numa sala de cinema, temos diante de nós dois conjuntos: o das poltronas da sala e o dos espectadores. Sem contar, podemos assegurar se esses dois conjuntos têm ou não igual número de elementos e, se não têm, qual é o de menor número. Com efeito, se cada assento está ocupado e ninguém está de pé, sabemos sem contar que os dois conjuntos têm igual número. Se todas as cadeiras estão ocupadas e há gente de pé na sala, sabemos sem contar que há mais pessoas que poltronas.

Esse conhecimento é possível graças a um procedimento que domina toda a matemática, e que recebeu o nome de correspondência biunívoca. Esta consiste em atribuir a cada objeto de um conjunto um objeto de outro, e continuar assim até que um ou ambos os conjuntos se esgotem.

A técnica de contagem, em muitos povos primitivos, se reduz precisamente a tais associações de idéias. Eles registram o número de suas ovelhas ou de seus soldados por meio de incisões feitas num pedaço de madeira ou por meio de pedras empilhadas. Temos uma prova desse procedimento na origem da palavra "cálculo", da palavra latina calculus, que significa pedra.

A idéia de correspondência
A correspondência biunívoca resume-se numa operação de "fazer corresponder". Pode-se dizer que a contagem se realiza fazendo corresponder a cada objeto da coleção (conjunto), um número que pertence à sucessão natural: 1,2,3...

A gente aponta para um objeto e diz: um; aponta para outro e diz: dois; e assim sucessivamente até esgotar os objetos da coleção; se o último número pronunciado for oito, dizemos que a coleção tem oito objetos e é um conjunto finito. Mas o homem de hoje, mesmo com conhecimento precário de matemática, começaria a sucessão numérica não pelo um mas por zero, e escreveria 0,1,2,3,4...

A criação de um símbolo para representar o "nada" constitui um dos atos mais audaciosos da história do pensamento. Essa criação é relativamente recente (talvez pelos primeiros séculos da era cristã) e foi devida às exigências da numeração escrita. O zero não só permite escrever mais simplesmente os números, como também efetuar as operações. Imagine o leitor - fazer uma divisão ou multiplicação em números romanos! E no entanto, antes ainda dos romanos, tinha florescido a civilização grega, onde viveram alguns dos maiores matemáticos de todos os tempos; e nossa numeração é muito posterior a todos eles.

Do relativo ao absoluto
Pareceria à primeira vista que o processo de correspondência biunívoca só pode fornecer um meio de relacionar, por comparação, dois conjuntos distintos (como o das ovelhas do rebanho e o das pedras empilhadas), sendo incapaz de criar o número no sentido absoluto da palavra. Contudo, a transição do relativo ao absoluto não é difícil.

Criando conjuntos modelos, tomados do mundo que nos rodeia, e fazendo cada um deles caracterizar um agrupamento possível, a avaliação de um dado conjunto fica reduzida à seleçào, entre os conjuntos modelos, daquele que possa ser posto em correspondência biunívoca com o conjunto dado.

Começou assim: as asas de um pássaro podiam simbolizar o número dois, as folhas de um trevo o número três, as patas do cavalo o número quatro, os dedos da mão o número cinco. Evidências de que essa poderia ser a origem dos números se encontram em vários idiomas primitivos.

É claro que uma vez criado e adotado, o número se desliga do objeto que o representava originalmente, a conexão entre os dois é esquecida e o número passa por sua vez a ser um modelo ou um símbolo. À medida que o homem foi aprendendo a servir-se cada vez mais da linguagem, o som das palavras que exprimiam os primeiros números foi substituindo as imagens para as quais foi criado. Assim os modelos concretos iniciais tomaram a forma abstrata dos nomes dos números. É impossível saber a idade dessa linguagem numérica falada, mas sem dúvida ela precedeu de vários milhões de anos a aparição da escrita.

Todos os vestígios da significação inicial das palavras que designam os números foram perdidos, com a possível excessão de cinco (que em várias línguas queria dizer mão, ou mão estendida). A explicação para isso é que, enquanto os nomes dos números se mantiveram invariáveis desde os dias de sua criação, revelando notável estabilidade e semelhança em todos os grupos linguísticos, os nomes dos objetos concretos que lhes deram nascimento sofreram uma metamorfose completa.
Fonte: Dicionário Enciclopédico Conhecer - Abril Cultural



MESOPOTÂMIA
Trabalho de pesquisa elaborado por
MÁRCIO LUÍS FREIRE
em novembro de 2005
INTRODUÇÃO



A Matemática como a concebem nos dias atuais foi fruto de uma demorada e profícua evolução, desde os homens das cavernas, passando por todas as grandes civilizações do passado até chegar à complexidade do mundo mercantilista e globalizado atual. A finalidade desse trabalho é mostrar, em forma de evidenciação, que a matemática desenvolvida pelos povos da Mesopotâmia entre os anos de 2800 a 1880 a.C. dão suportes lógicos e consistentes aos anseios de todas as culturas posteriores, demonstrando, assim, sua grande relevância histórica.

ASPECTOS GEOGRÁFICOS E SOCIOLÓGICOS DA MESOPOTÂMIA
Geograficamente a Mesopotâmia está situada entre os rios Tigre e Eufrates no Oriente Médio, no chamado crescente fértil, onde atualmente se localiza o Iraque e a Síria. Em grego, a palavra Mesopotâmia significa entre rios. Os povos que formavam a Mesopotâmia foram os Sumérios, Acádios, Amoritas, Caldeus e Hititas, os quais lutavam pela posse das terras aráveis.. Porém ao contrário do que ocorria com as águas do rio Nilo, os períodos de cheia dos rios Tigre e Eufrates eram bastante irregulares, obrigando a realização de numerosas obras de irrigação e drenagem, com períodos de observação e desenvolvimento com uma maior dificuldade.. As civilizações que habitam essa região prosperaram com base na agricultura. Desenvolveram-se nos vales dos rios Tigre e Eufrates devido, à fertilidade da terra decorrente das inundações destes.
O centro, correspondendo ao curso médio dos rios, era chamado de Acádia, sobressaindo as cidades de Babilônia, Uruc, Nipur, Sipar e Acad. O norte era denominado Assíria, destacando-se as cidades de Nínive, Nimrud e Assur.
Por volta de 3 500 a.C., vindos provavelmente da Ásia Central, os sumérios fixaram-se na Baixa Mesopotâmia, fundindo-se étnica e culturalmente com a população local. Com a sua chegada, deu-se o aperfeiçoamento dos métodos de cultivo e de irrigação. A agricultura, além de abastecer regularmente a população, passou a gerar excedentes para o comércio. Desenvolveram-se o artesanato especializado, o uso de metais e surgiram inovações técnicas como a roda.
A população expandiu-se, dando origem a novos grupos sociais como sacerdotes, funcionários, mercadores, artesãos e soldados. Assim, as aldeias transformaram-se em cidades, como Ur, Uruk, Lagash, com governo próprio e profissões variadas. Estabeleceu-se ativo comércio entre as cidades de Suméria e seus vizinhos. Caravanas de mercadores levavam cargas de cevados e tecidos para a Ásia Menor e para o Irã, retornando com madeira, pedra e metais, que eram transformados em instrumentos, armas e jóias.
A revolução urbana fez surgir na Suméria e posteriormente em Acade, cerca de 15 ou 20 cidades-Estado politicamente independentes, mas com língua, religião, organização social e sistema econômico semelhantes.
Para desenvolver a agricultura, os habitantes desses vales inventaram sistemas de canalização e de diques para controlar a direção da água durante as enchentes. Estes sistemas também controlavam a drenagem das águas de volta aos rios. Os sumérios, babilônicos e os acádios formaram os principais ocupantes desta região entre os anos 2800 a.C. e 1800 a.C. Foi neste período que surgiram os primeiros centros urbanos da humanidade, com uma vida de ostentação da riqueza, complexa e variada, em que a lealdade política não era mais em relação a tribos ou clãs, mas sim ao rei que governava. As principais cidades dessa época foram:Ur, Uruk, Eridu, Nipur e Zagash. Essas cidades eram governadas pelos patesis, que representavam ao mesmo tempo a figura do chefe militar e sacerdote. Desenvolveu-se uma sociedade baseada em atividades agrícolas, pastoris, comerciais e artesanais. A formação de castas, organizada em forma piramidal foi inevitável.
O posicionamento social do individuo, geralmente, era determinado pelo critério de nascimento e hereditariedade. Sua estrutura era dividida em camadas sendo a base da pirâmide composta pelos escravos, um número significativo e constituído principalmente por prisioneiros de guerra e homens livres pobres que se vendiam para sobreviver. Acima dos escravos, existiam os artesãos e os camponeses, que pertenciam às classes de homens livres, mas não recebiam o suficiente pelo trabalho que realizavam. E no topo da hierarquia social estava o rei, que possuía riquezas fabulosas, palácios grandiosos e vários funcionários que auxiliavam na administração do império. Administração essa que se caracterizava pelo domínio de todos os grupos sociais em um governo de fundamento teocrático. O centro de cada cidade da Mesopotâmia era dominado pelo “temenos”, conjunto de templos, destacando-se o “zigurat” ou torre de degraus com um pequeno santuário no alto da elevação.
O templo era dedicado ao culto e às oferendas, como mostra a figura abaixo.

Indiscutivelmente, a principal contribuição que os mesopotâmicos realizaram para o desenvolvimento do conhecimento foi à invenção de um tipo de escrita, a qual era feita por estiletes em uma placa de argila mole que depois secavam ao sol. Tais letras tinham a forma de cunha e, por isso, foram chamadas de cuneiforme. Eram monopolizadas pelos sacerdotes que tinham como uma de suas funções registrar as atividades comerciais. Os sacerdotes dos templos religiosos, através de seu vasto sistema tributário, coletavam e administravam gigantescas somas de bens, tais como terrenos, incluindo rebanhos, manadas, rendas e propriedades rurais. Entretanto, por causa da amplitude e variedade da riqueza acumulada, os sacerdotes enfrentaram problemas sem precedentes na história humana.

Para essa prestação de contas como intendentes, não era possível confiar na memória a respeito dos tributos pagos, transações concluídas, sendo necessária uma forma de registro permanente. O surgimento da escrita justificou-se pelo crescimento das economias centralizadas, quando os funcionários dos palácios e templos sentiram a necessidade de manter o controle das quantidades de cereais e dos rebanhos de carneiros e gado que entravam e saíam dos celeiros e fazendas. Era impossível depender apenas da memória de um homem para armazenar todas as transações realizadas, além da necessidade de se transmitir os fatos a outros sacerdotes quando houvesse o falecimento de quem controlava essas operações, assim, tornou-se indispensável à criação de novos métodos que mantivessem registros confiáveis e permanentes.
COMÉRCIO E ECONOMIA NA MESOPOTÂMIA
Os mesopotâmicos possuíam uma economia bastante desenvolvida, com métodos de intercâmbio comercial que incluíam o uso de uma moeda metálica e já dispunham de uma rede bancária primitiva. Baseada na agricultura, principalmente no cultivo da cevada, produzia também outros produtos como o óleo de linhaça e de gergelim, linho, trigo e hortigranjeiros. A cevada muitas vezes era usada como meio de pagamento de salários e em rações diárias, sendo matéria-prima para a fabricação da bebida natural: a cerveja. Os rebanhos de ovelhas e cabras pastavam nos campos fora da estação de plantio e o gado quando havia água suficiente. A produção da lã era extensa e convertida em peças de tecidos. Santos (2001) nos afirma que:
Os sumérios eram excelentes agricultores, eram peritos em irrigação; sendo favorecidos pelos rios Tigre e Eufrates. Eram bons comerciantes. A economia do país se fundamenta na lavoura e no comércio. Desenvolveram-se intensas relações comerciais com os países próximos. Trocavam-se metais, madeiras, produtos agrícolas e manufaturados. Usavam-se recibos, faturas, títulos de créditos, notas promissórias. Circulavam como dinheiro, barras de ouro ou prata. A unidade monetária padrão de troca era um ciclo de prata. O comércio era ativo e empregava muita gente.
Outra atividade econômica era a pesca, utilizando-se de pequenos barcos de junco, anzol e rede os sumérios pescavam no Golfo Pérsico, nos rios, canais e pântanos. O artesanato foi um dos responsáveis pelo grande impulso dado ao comércio. Os artesãos eram muito habilidosos e fabricavam móveis de madeira; vasilhas de argila, de pedra, de madeira e de vidro; objetos de metal, de couro (sandálias, roupas, equipamentos militares), bijuterias e tijolos (secos ao sol ou cozidos em forno). As lãs retiradas das ovelhas eram utilizadas para confecção de tecido. As famílias ou oficinas têxteis, constituídas pelos homens livres, eram os realizadores do trabalho artesanal.
Segundo texto publicado no site Vbcontrol (2003) “há duas formas básicas para se obter os materiais que países necessitam: pela guerra ou comércio. Tais materiais são geralmente exigidos como tributos ou tomados por pilhagem após uma expedição militar”.
A região mesopotâmia carecia de recursos minerais e de madeira, indispensáveis para a construção de grandes monumentos, além de resistentes. Ao longo da história, os mesopotâmicos tiveram cada vez mais necessidade destes materiais, que vinham de longe: ou das florestas do Líbano ou das montanhas do Irã (atualmente). Essas montanhas também eram ricas em minerais, pedras e metais. Por este motivo, o comércio começava a ser executado com todas as regiões vizinhas. De acordo com Cruz e Silva (2002) devido ao incremento na atividade mercantil, bem como ao aumento de mercadorias em circulação, o sistema de tábuas contábeis tornou-se complexo. Segundo Iudícibus (1997) “a preocupação com as propriedades e a riqueza é uma constante no homem da Antigüidade,[...] e o homem teve de ir aperfeiçoando seu instrumento de avaliação patrimonial à medida que as atividades foram desenvolvendo-se em dimensão e em complexidade”. A situação geográfica da Mesopotâmia, na rota do comércio entre Oriente e Ocidente, estimulou as atividades comerciais, tornando necessários rudimentos de aritmética aplicada, tais como sistemas de contabilidade, noção de juros, etc. Em meados do terceiro milênio os comerciantes da Suméria já empregavam um sistema de pesos e medidas, fazendo uso de juros simples e compostos.
APLICAÇÕES DA MATEMÁTICA E DA GEOMETRIA MESOPOTÂMICA
Os Babilônicos (assim também eram chamados os povos mesopotâmicos) tinham uma maior habilidade e facilidade para efetuar cálculos, talvez em virtude de sua linguagem ser mais acessível que a egípcia. Eles tinham técnicas para equações quadráticas e bi-quadráticas, além de possuírem fórmulas para áreas de figuras retilíneas simples e fórmulas para o cálculo do volume de sólidos simples. Sua geometria tinha suporte algébrico. Também conheciam as relações entre os lados de um triângulo retângulo e trigonometria básica, conforme descrito na tábua “Plimpton 322”.
Os mesopotâmicos foram os inventores da álgebra, do sistema posicional, desenvolveram os cálculos de divisão e multiplicação, incluindo a criação da raiz quadrada e da raiz cúbica. E utilizando símbolos para unidades e dezenas, podiam representar qualquer número. Os símbolos utilizados por este povo para representar os números eram: v que correspondia a 1 (um) e o < que correspondia ao 10 (dez). O sistema numérico adotado pelos sumérios é uma combinação do sistema decimal e do sistema sexagesimal. Assim tem-se:
Os babilônios usavam um sistema posicional que, em alguns aspectos era semelhante ao dos egípcios. Algumas inscrições mostram que, surpreendentemente, eles usavam não somente um sistema decimal mas também um sistema sexagesimal (isto é, base 60) , o qual trazia enormes facilidades para os cálculos, visto que os divisores naturais de 60 são 1,2,3,4,5,6,10,12,15,20,30,60, facilitando o cálculo com frações.
Usavam um traço vertical para representar as unidades e outro desenho para as dezenas:
No sistema decimal, os números de 1 a 99 eram representados por agrupamentos destes símbolos, por exemplo,
O símbolo para 100 era composto por traços:
e números superiores a 100, representados novamente por agrupamento. Assim, por exemplo, temos:

O símbolo indica 10 vezes 100, isto é, 1000.


Também empregava, em algumas tabuletas, o sistema sexagesimal. Os números de 1 a 59 eram representados novamente por agrupamento simples e a partir dali, se escreviam "grupos de cunhas", com base 60. Por exemplo,

Os babilônios chegaram a empregar um símbolo, formado por duas cunhas inclinadas, para representar a ausência de um grupo. Por exemplo,

Como este símbolo não era de uso freqüente, e ainda, nunca foi usado no fim de uma expressão, o sistema babilônio apresentava ambigüidades. Por exemplo,

poderia representar o número , etc.
Nosso sistema de numeração indo-arábico é um sistema de numeração posicional de base 10. Ele é preciso e não apresenta ambigüidades, justamente porque temos o símbolo 0 (zero) para representar ausência de uma casa.
A base de numeração 10 é o sistema usado quase que universalmente pelo fato de termos dez dedos disponíveis nas mãos para nos auxiliar nos cálculos.
Cidade da informática (2001) nos traz o seguinte texto:
A astronomia e as matemáticas começaram a buscar essas respostas, e a criar aparatos que lhes serviam como para ordenar o mundo e os ciclos que a natureza dispõe. Os primeiors calendarios usados pelos babilonicos mediam os meses de acordo com as fases lunares e os anos, conforme a posição do sol. Pelo testemunho que perdura nas tabuas de argila que tem chegado até nós, hoje sabemos que por volta do ano de 1950 a.c, o povo babilônico adotou a base 60 para medir o tempo, ou seja, uma hora é igual a 60 minutos. Mas para que isso pudesse acontecer deveriam contar no solo com sistemas de numeração, e também com signos que representava quantidades.
Ou seja, o sistema sexagesimal teve sua origem na astronomia, especificamente, na contagem do tempo, ou melhor na divisão do tempo em horas, minutos e segundos. No qual 1 (uma) hora equivale a 60 minutos.
Estes números eram escritos mediante a pressão da extremidade mais larga ou menor de um cálamo de junco sobre a argila ou verticalmente (para desenhar um círculo) ou obliquamente. Com o passar do tempo esses números passaram a apresentar uma forma angular.
Exemplificando o sistema numérico utilizado pelos sumérios, tem-se:
1º) << << = 20 x 60 + 20 = 1.220
2º) yyyy v = 2 x 602 + 2 x 60 + 11 = 7.331
Observa-se que os mesopotâmicos começaram a calcular da direita para esquerda, ou seja, o primeiro grupo de símbolos representam as unidades, o segundo grupo representa as dezenas, depois seriam as centenas e assim por diante. Um outro fato curioso é que, retirando o grupo das unidades, os demais grupos são multiplicados pelo fator 60, onde as dezenas apenas por 60, as centenas por 60 ao quadrado, e assim continuaria, aumentando-se as casas aumentam-se os expoentes. Este tipo de cálculo deixa bem claro que os sumérios já conheciam e utilizavam as potências quadradas e cúbicas.
. Os sumérios utilizaram a formula:

para utilizar a multiplicação. A divisão se assimila a multiplicação a seguir:


Algumas tábuas mostram que os mesopotâmicos chegaram a resolver equações do 2. º e 3. º graus, usando palavras como incógnitas num sentido abstrato e conheciam bem o processo de fatoração. Não só resolviam as equações quadráticas, seja pelo método equivalente ao da substituição numa fórmula geral, seja pelo método de completar quadrados, como também discutiam algumas cúbicas e algumas biquadradas.
Acredita-se que os povos mesopotâmicos dominavam também as fórmulas de progressões geométricas. Seus desenvolvimentos podem ser constatados em tabuletas que indicavam relações entre os lados de um triângulo. Porém, essas tabuletas mostram apenas as questões e os resultados.
As implantações dos sistemas de irrigação desenvolvidos exigiam, para a execução do trabalho, alguma forma primitiva de engenharia e agrimensura, atividades que pressupõem a aplicação de certos conhecimentos geométricos, tais como mediadas de áreas, linhas de nível, etc.
Da matemática mesopotâmica constata-se também a familiarização com as regras gerais de cálculo da área do retângulo, do triângulo retângulo e isóscele, de um trapézio retângulo e, do volume de um paralelepípedo e mais, geralmente do volume de um prisma reto de base trapezional.
Tinham também uma fórmula para calcular o perímetro da circunferência a que equivale. Conheciam o volume de um tronco de cone e de um tronco de pirâmide quadrangular regular. Sabiam que os lados correspondentes de dois triângulos retângulos semelhantes são proporcionais. Utilizavam-se de uma ‘corda com 13 nós’ de forma a que o espaço entre eles fosse igual, isto é, a corda media 12 unidades, sendo cada unidade o espaço entre dois nós consecutivos, para construir um triângulo retângulo, mas não sabiam expressar teoricamente esse conhecimento.
Essa técnica foi divulgada por Pitágoras, em 560 a.C. após ter realizado várias viagens à Mesopotâmia, cujo saber havia fascinado Tales, onde estudou geometria com sacerdotes, vindo a ter contato com o método da ‘corda de 13 nós’. Com base nesta técnica desenvolveu o que hoje conhecemos como Teorema de Pitágoras ‘num triângulo, o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos’. Pitágoras não só se satisfez com a generalização da propriedade a que chegou, como também se preocupou com a sua demonstração, ou seja, em provar que essa regra se aplicava a todos os triângulos retângulos.
Somente em 1637 d.C. foi provada a relação de posicionamento utilizado pelos sumérios nas construções de seus templos, palácios e monumentos arquitetônicos. Tal feito foi realizado por Descartes. Ele criou uma fórmula algébrica para representar um fato trivial e infantil já conhecido por todos; de que um ponto em uma folha de papel retangular está infalivelmente, como é evidente, onde as duas linhas de suas duas distâncias medidas perpendiculares a duas margens adjacentes da folha, se encontram. Em linguagem geométrica, isto quer dizer que um ponto em um plano pode ser representado pelos valores (hoje chamado coordenadas cartesianas) das suas duas distâncias (x, y), tomadas perpendiculares a dois eixos que se cruzam em ângulo reto nesse plano, como a convenção de lado positiva e negativa para um e outro lado do http://www.blogger.com/post-edit.g?blogID=8057911454459131264&postID=740516922785073364#ponto de cruzamento dos eixos.
O APARECIMENTO DE

Uma das características mais relevantes da matemática suméria era o uso do sistema de numeração posicional. Isto possibilitava o cálculo do valor numérico de grandezas geométricas com uma precisão admirável para a época. Um exemplo notável pode ser visto em um tablete sumeriano da Yale Babylonian Collection, catalogado sob a sigla YBC7289.

Tablete sumério YBC7289, da Yale Babylonian Collection.
Nele vemos representado um quadrado, suas duas diagonais e três números:

escritos no sistema sexagesimal sumeriano. Nessa notação os algarismos do sistema sexagesimal são indicados por 0, 1, 2,..., 9, 10, 11, 12,...,59, e a vírgula separam as casas.

Desenho esquemático do tablete sumério YBC7289, mostrando um quadrado, suas duas diagonais, e três números sexagesimais, um sendo o valor do lado do quadrado, outro uma aproximação do valor de , e o terceiro uma aproximação do valor de sua diagonal.
Calculando na base sexagesimal temos

portanto c = a.b
Por outro lado, interpretando na figura acima como o valor da diagonal do quadrado de lado a, temos, em virtude do Teorema de Pitágoras,

Assim, relacionando c=a.b e, vemos que b deve ser uma aproximação de

Lembrando que os sumérios não tinham notação para separar a parte inteira da parte fracionária na representação escrita dos números, passamos a interpretar a, b, e c como:
a=(0;30) 60
b=(1;24,51,10)60
c=(0;42,25,35)60
Vemos que

que é próximo de 2.
Resulta a aproximação


No sistema decimal isso equivale a

Comparando com
vemos que a aproximação calculada pelos sumérios tem erro de

Este foi sem dúvida um cálculo notável
PARTIDAS DOBRADAS E CONHECIMENTO MATEMÁTICO
A matemática sempre foi utilizada como um instrumento, através do qual se podia explicar os fenômenos naturais, ou seja, suas causas e conseqüências. Por exemplo, aplicando-se a dualidade dos fatos, pela matemática, obtêm-se na Astronomia a relação do tempo em horas-dia e horas-noite.
Os mesopotâmicos também representavam a natureza dos seres através da matemática, ou seja, os números pares eram considerados seres femininos e os ímpares, masculinos. Até mesmo na grafia estava presente a dualidades das coisas, o que se pode verificar claramente no símbolo utilizado para representar o infinito. Esse símbolo representa a união de dois círculos (4), onde um deles representa o mundo material e o outro o mundo imaterial, em outras palavras, o infinito significa graficamente a união dos dois mundos.
Os números também representam o bem e o mal. Representavam o bem, os números positivos, que significam a soma, o acréscimo; já os números negativos o mal, a exclusão, a subtração. Paralelamente a esse raciocínio desenvolveu-se o controle do patrimônio, o sentido do que me pertence e o que pertence à outra pessoa. Segundo Sá (2002) “o ‘meu’ e o ‘seu’ deram, na época, origem a registros especiais de ‘débito’ (o que alguém tem que me pagar) e ‘crédito’ (o que devo pagar a alguém)”, onde teríamos uma primeira versão do registro por Partidas Dobradas.
Uma outra aplicação da matemática pelos mesopotâmicos se refere às funções. Este povo conhecia o sentido amplo da palavra ‘relação’. Conforme Brito [s.d] diz-se que existe uma relação entre duas coisas quando existe um elo de ligação, uma correspondência, uma vinculação entre elas.
Usando a representação de conjuntos podemos visualizar estes exemplos mais facilmente. Dentro de cada conjunto podemos apresentar seus elementos (valores) e associá-los na relação. Como pode ser observado na figura 1.

Figura 1 Correlação entre conjuntos
Observe que do conjunto origem (A) partem os elos de ligação em direção ao conjunto destino (B).
Com esta noção de ‘relação’ em mente e, particularmente, evidenciando as situações acima ilustradas, podemos definir o que vem a ser uma função. A idéia de relação biunívoca de conjunto que predomina numa função entre origem e destino coaduna com a idéia das Partidas Dobradas de origem e aplicação de recursos.
A forma intuitiva do aprendizado das funções através da representação de conjuntos é trocada, na prática, pelo Sistema Cartesiano, no qual colocamos o domínio no eixo do x e o contradomínio (em que estarão as imagens) no eixo do y. Desta forma podemos visualizar melhor o par ordenado (x,y) e o comportamento das funções que se deseja estudar. Assim temos:

Figura 2 Sistema Cartesiano
Como já foi dito antes, os mesopotâmicos não deixaram registro desse conhecimento, mas já foi provado que não só conheciam, como os utilizavam para a edificação de suas construções monumentais.
CONCLUSÃO
Concluímos que a matemática, assim como as ciências de modo geral desenvolveram-se devido as necessidades que surgiam dia-dia. A matemática na Mesopotâmia surgiram como uma ciência prática, com o objetivo de facilitar o cálculo do calendário, a administração das colheitas, organização de obras públicas e a cobrança de impostos, bem como seus registros.
As águas dos rios Tigre e Eufrates proporcionavam facilidades para o transporte de mercadorias, o que ajudou a desenvolver um processo de navegação.
Foram desenvolvidos nestes rios grandes projetos de irrigação das terras cultiváveis e a construção de grandes diques de contenção, abrindo assim o caminho para o desenvolvimento de uma engenharia primitiva.
Procedeu-se ao desenvolvimento de uma astronomia rudimentar para o cálculo do período de cheias e vazantes dos rios, mesmo que estes períodos não fossem regulares como os do rio Nilo no Egito.
E também, pelo fato da Mesopotâmia estar situada no centro do mundo conhecido da época, o que propiciava muito contato com outros povos, ela teve um papel muito grande no desenvolvimento da matemática de um povo que teve um papel muito importante na história: o povo Grego. Graças a este contato com o povo Grego, muito desta matemática chegou até os nossos dias.
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